Tratamento por Ondas de Choque para Fascite Plantar

fevereiro 21, 2025
escrito por: Dr. Marcus Yu Bin Pai

Médico Fisiatra e Especialista em Dor pela AMB. Doutorado em Ciências pela USP.

A fascite plantar é uma das causas mais comuns de dor no pé, afetando principalmente a região do calcanhar e a parte inferior do arco do pé. Ela ocorre quando a fáscia plantar – faixa espessa de tecido que conecta o calcanhar aos dedos – sofre inflamação ou pequenas lesões, muitas vezes em decorrência de sobrecarga, uso inadequado de calçados ou problemas de pisada.

A dor da fascite plantar costuma ser mais intensa ao acordar ou depois de longos períodos de descanso, podendo prejudicar significativamente a rotina diária e a prática de atividades físicas.

Nos últimos anos, o tratamento por ondas de choque se tornou um recurso cada vez mais valorizado para o alívio de dores crônicas, incluindo a fascite plantar. A técnica, também chamada de terapia por ondas de choque extracorpóreas (ESWT, na sigla em inglês), utiliza impulsos de alta energia para estimular a recuperação dos tecidos lesionados, reduzindo inflamações e promovendo a cicatrização.

Neste texto, vamos abordar de forma detalhada como esse tratamento funciona, suas indicações, benefícios e cuidados necessários para pacientes com fascite plantar.

O que é Fascite Plantar

A fascite plantar é caracterizada pelo desgaste, tensão ou inflamação na fáscia plantar, tecido que desempenha papel fundamental na sustentação do arco do pé e na absorção de impactos durante a caminhada ou corrida. Fatores como excesso de peso, uso de calçados sem suporte adequado, aumento súbito de atividades físicas e pé plano ou cavo podem contribuir para o surgimento do problema.

É comum que a dor se concentre na base do calcanhar, podendo irradiar-se pela sola do pé. Pessoas que ficam em pé por muito tempo ou correm intensamente também são mais propensas à fascite plantar.

Em alguns casos, quando a inflamação é recorrente e prolongada, pode ocorrer formação de esporão calcâneo, uma pequena protuberância óssea na região do calcanhar que agrava ainda mais o quadro doloroso.

Tratamento por Ondas de Choque: Conceito e Mecanismo de Ação

A terapia por ondas de choque extracorpóreas (ESWT) utiliza dispositivos que geram impulsos de energia acústica. Essas ondas são aplicadas diretamente na área dolorosa, com a finalidade de estimular processos de reparo natural do corpo.

Apesar de parecer “agressivo” em um primeiro momento, o procedimento é minimamente invasivo e não requer cirurgia. As ondas de choque agem tanto no alívio imediato da dor quanto na recuperação a longo prazo, devido a mecanismos como:

  • Estimulação da circulação sanguínea: As microvibrações na região lesionada ajudam a aumentar o fluxo de sangue, levando mais nutrientes e fatores de reparo celular para o local;
  • Promoção da regeneração tecidual: As ondas de choque aceleram a resposta inflamatória controlada, estimulando a formação de novos vasos sanguíneos (neovascularização) e o reparo de microlesões no tecido fascial;
  • Interrupção do ciclo de dor crônica: A energia acústica atua diretamente nas terminações nervosas, podendo dessensibilizar receptores de dor. Também há liberação de substâncias naturais do corpo que reduzem a percepção dolorosa;
  • Fragmentação de calcificações: Em casos associados a esporão calcâneo ou microcalcificações na fáscia, as ondas de choque auxiliam na fragmentação dessas áreas endurecidas.

Indicações e Candidatos ao Tratamento

O tratamento por ondas de choque é indicado principalmente para casos de fascite plantar crônica que não responderam adequadamente a medidas conservadoras, como repouso, uso de palmilhas, fisioterapia convencional, alongamentos e anti-inflamatórios orais.

Normalmente, os médicos consideram essa abordagem quando a dor persiste por mais de três a seis meses e limita significativamente as atividades diárias.

Outras condições dolorosas que podem se beneficiar das ondas de choque incluem tendinopatia do manguito rotador, epicondilite lateral (cotovelo de tenista), tendinite patelar, calcificações no ombro e bursite trocantérica.

No contexto específico da fascite plantar, os melhores candidatos são pessoas que já tentaram diversos métodos, mas ainda enfrentam dor ao caminhar, correr ou mesmo ao ficar muito tempo em pé.

Além disso, é importante avaliar a saúde global do paciente antes de iniciar o tratamento. Algumas condições, como distúrbios de coagulaçãoinfecções ativas na área e certos tipos de alterações sensoriais, podem contraindicar ou exigir adaptações na terapia por ondas de choque.

Como é Realizada a Terapia por Ondas de Choque

O tratamento por ondas de choque para fascite plantar costuma ser realizado em ambiente ambulatorial, sem necessidade de internação ou anestesia geral.

Veja as etapas mais comuns:

  1. Avaliação Inicial: O profissional de saúde confirma o diagnóstico de fascite plantar, identifica exatamente a área a ser tratada e explica como a sessão ocorrerá.
  2. Posicionamento e Preparação: O paciente geralmente permanece sentado ou deitado, com o pé apoiado de forma confortável. É aplicado um gel sobre a pele na área do calcanhar, facilitando a condução das ondas de choque.
  3. Ajuste do Aparelho: O dispositivo de ondas de choque é posicionado sobre a região dolorida e ajustado de acordo com a intensidade e a profundidade desejadas. A dose de energia varia conforme a gravidade do caso e a sensibilidade do paciente.
  4. Aplicação das Ondas: As ondas de choque são emitidas em pulsos rápidos, gerando uma sensação de desconforto leve a moderado, geralmente tolerável. Cada sessão dura cerca de 10 a 20 minutos, dependendo do protocolo adotado.
  5. Pós-Tratamento: Após a sessão, pode haver um leve inchaço ou vermelhidão na região tratada, mas normalmente o paciente retoma suas atividades cotidianas imediatamente. Recomenda-se moderação em exercícios físicos intensos por alguns dias, a fim de dar tempo para o tecido se recuperar.

O número total de sessões varia, mas um protocolo comum inclui de três a cinco aplicações, realizadas semanalmente ou com intervalos de até duas semanas, conforme orientação médica.

Benefícios e Vantagens

A terapia por ondas de choque se destaca como opção de tratamento minimamente invasiva, com poucos efeitos colaterais e índice relativamente baixo de complicações.

  • Redução efetiva da dor: Muitos indivíduos relatam diminuição substancial da dor no calcanhar após algumas sessões, o que permite retomar atividades interrompidas pela condição;
  • Promoção de cicatrização natural: Ao estimular a resposta inflamatória controlada, o tratamento fortalece a estrutura da fáscia plantar, reduzindo a chance de recaídas;
  • Evita cirurgia: Para muitos pacientes, as ondas de choque podem substituir procedimentos mais invasivos, diminuindo riscos e encurtando o período de recuperação;
  • Procedimento rápido: Cada sessão é breve e não requer preparo ou internação. Assim, o paciente pode retomar imediatamente suas atividades cotidianas ou de trabalho;
  • Pode ser associado a outras terapias: Fisioterapia, exercícios de alongamento, palmilhas ortopédicas e ajustes de calçado podem ser mantidos em paralelo para potencializar os resultados.

Possíveis Efeitos Colaterais e Cuidados

Embora o tratamento por ondas de choque seja considerado seguro, algumas reações leves ou moderadas podem ocorrer, como:

  • Desconforto e vermelhidão temporários: É comum sentir uma dor passageira durante ou logo após a sessão, bem como notar um leve inchaço na região tratada;
  • Risco mínimo de lesão tecidual: Em casos raros, aplicações muito intensas ou realizadas de forma inadequada podem gerar hematomas, mas são situações pouco frequentes;
  • Necessidade de repouso relativo: Mesmo sendo um método pouco invasivo, recomenda-se evitar corridas ou saltos de impacto por alguns dias, para otimizar o processo de cicatrização.

Fatores que Influenciam a Eficácia

A resposta ao tratamento por ondas de choque pode variar de acordo com fatores individuais e comportamentais.

  • Duração do problema: Casos crônicos de fascite plantar, com mais de seis meses de evolução, podem requerer um número maior de sessões e um pouco mais de tempo para apresentar resultados definitivos;
  • Nível de atividade física: Pessoas muito ativas podem precisar adequar o programa de exercícios para não sobrecarregar o calcanhar durante a fase de tratamento;
  • Hábitos diários e calçados adequados: Persistir em sapatos com pouca absorção de impacto pode retardar a cura. Um calçado que ofereça suporte adequado ao arco plantar colabora para reduzir a sobrecarga na fáscia;
  • Manutenção de alongamentos e fortalecimento: Trabalhar a flexibilidade e o fortalecimento dos músculos da panturrilha e do pé ajuda a prevenir recaídas e favorece a recuperação;
  • Adesão ao tratamento global: Seguir corretamente as instruções médicas, comparecer às sessões agendadas e não interromper as atividades complementares (como fisioterapia) são determinantes para o sucesso terapêutico.

Dicas para Complementar o Tratamento

A terapia por ondas de choque costuma ser ainda mais eficaz quando combinada a outras estratégias de manejo da fascite plantar. Algumas dicas que podem ajudar:

  1. Alongamentos Diários: Alongar a fáscia plantar e a musculatura posterior da perna logo ao acordar reduz a tensão no calcanhar e melhora a mobilidade;
  2. Uso de Palmilhas Ortopédicas: Palmilhas sob medida ajudam a distribuir melhor o peso corporal, aliviando a pressão excessiva na região do calcanhar;
  3. Fortalecimento Muscular: Exercícios como elevação de calcanhares e fortalecimento da musculatura intrínseca do pé aumentam a estabilidade e reduzem a sobrecarga;
  4. Massagem com Bola de Tênis: Rolar uma bolinha por baixo do arco do pé, aplicando leve pressão, ajuda a relaxar a fáscia plantar;
  5. Aplicação de Gelo: Bolsas de gelo na sola do pé, por 10 a 15 minutos, contribuem para diminuir a inflamação e aliviar a dor após atividades físicas.

Essas medidas ajudam a acelerar a recuperação, permitem o retorno mais rápido às rotinas normais e também agem como prevenção para crises futuras.

Perspectivas de Longo Prazo

A fascite plantar pode demorar algumas semanas ou até meses para se resolver completamente, mesmo após o início do tratamento adequado. O fato de o alívio não ser instantâneo não deve desanimar o paciente, pois o processo de regeneração tecidual requer tempo.

Na maioria dos casos, pacientes que seguem todas as orientações médicas e realizam sessões adequadas de ondas de choque relatam melhora significativa ou até mesmo total remissão dos sintomas de fascite plantar.

Conclusão

O tratamento por ondas de choque para fascite plantar representa um avanço importante na busca por soluções eficazes e menos invasivas para dores crônicas nos pés. Ao estimular processos de reparação tecidual e reduzir o desconforto, essa modalidade terapêutica abre espaço para que pacientes retomem suas rotinas e atividades físicas sem o incômodo causado pela fascite plantar.

Para obter resultados satisfatórios, é essencial passar por uma avaliação criteriosa com um profissional habilitado, que possa indicar a intensidade e a frequência mais adequadas das sessões, além de orientar sobre o uso de recursos complementares.

Associar o tratamento por ondas de choque com fisioterapia, exercícios de alongamento, calçados apropriados e mudanças de hábitos potencializa significativamente a eficácia da intervenção e contribui para um retorno seguro às atividades normais.

Referências

  1. Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia – Materiais sobre fascite plantar
  2. Instituto de Reabilitação e Terapia por Ondas de Choque – Guia clínico
  3. Associação Brasileira de Medicina Física e Reabilitação – Protocolos de dores no pé
  4. Revista de Ortopedia e Fisioterapia – Estudos sobre eficácia das ondas de choque
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Médico especialista em Dor e Fisiatria pela USP. Área de Atuação em Dor pela Associação Médica Brasileira. Doutorado em Ciências pela Universidade de São Paulo. Professor e Colaborador do Grupo de Dor do Hospital das Clínicas da USP.